morro do Macaco

sábado, julho 22, 2006

do alto do Corcovado, ele tudo observa silenciosamente (29)

No momento exato em que ela me beijou a boca, eu ouvi o mais estridentes de todos os gritos já gritados neste mundo:

–– Djalma, seu preto safado! Você me paga, seu nego gaiteiro!

Ela gritou forte pra cachorro acordando toda a cambada que dormitava de papo pro ar naquele sábado de sol na praia de Ipanema. Como um enorme catiripapo, uma imensa traulitada, o grito atravessou toda a orla calando as ondas, ensurdecendo os ventos, congelando o movimento das marés, intimidando o fonfom das buzinas atrevidas de Ipanema ao Leblon.

As sirenes das ambulâncias desesperadas cortando a avenida Brasil em altíssima velocidade definharam inertes e, na mais completa apatia, desfaleceram. O ronco dos aviões da ponte-área no aeroporto Santos Dumont minguaram, minguaram e silenciaram. O grito de gol no Macaranã foi se reduzindo a um resmungo macambúzio e acabou um mero suspiro – um bocejo. Nas rodas de partido alto, samba e choro, os violões, tamborim e cavaquinhos calaram. No labirinto de vielas, becos e ladeiras as metralhadoras emudeceram e, amedrontadas, silenciaram. No mar, o ruído dos peixes e das algas silenciaram. Nos terreiros de macumba os tambores silenciaram – os santos respeitosamente em atitude de deferência esperaram. Os astronautas na órbita sobre a cidade do Rio pararam seus silenciosos movimentos e também esperaram.

O grito da mulata Mercedez cruzou a cidade do Rio de Janeiro silenciando tudo e todos –– calando João Gilberto & todo o tropel do mundo.

Corcovado, 1950

"Eu peço o silêncio de um minuto", em vila Isabel gritou Noel Rosa

quinta-feira, julho 20, 2006

nasci num clima quente

Orlando Silva, o encantador das multidões
o pessoal da praia diz que família dela anda preocupada demais porque eu sou moreno demais - acho que tem muito demais numa frase só.

segunda-feira, julho 17, 2006

muito perto do coração selvagem

perto do coração selvagem
(ela esbugalhou os olhos & leu em voz alta todo o meu azar)

domingo, julho 16, 2006

Realeza de Realengo

isso ainda vai acabar fazendo mal
Brisa toma mais uma coca-cola antes de rumar para o baile funk Realeza de Realengo.

eu fankeio?
tú fankeias!
ela fankeia?
nós fankeamos!
vós fankeais?
eles & elas fankeiam!

por que você meu bem
não fankeia também?

quarta-feira, julho 12, 2006

isso vai acabar em samba

isso vai acabar em samba
eu & a Brisa (de peruca & tamborim) sambando na gangorra!

terça-feira, julho 11, 2006

todo mundo agora quer cantar

que tal eu e você no escurinho do cinema?

todo mundo agora quer cantar a menina de biquíni branco! qualquer hora eu ainda perco a cabeça!

segunda-feira, julho 10, 2006

eu, a Brisa & o johnny

johnny não está pra brincadeira
tomamos mais uma coca-cola: eu, a Brisa & o johnny. a Brisa estava toda cheia de graça pro meu lado. o johnny é que não achou graça nenhuma e botou a boca no trombone!

domingo, julho 09, 2006

a tarde caía desengonçada sobre a praia de Ipanema (28)

***
Caminhei até a praia de Ipanema. Sentei de frente para o mar e comecei a contar ondas, barquinhos, borboletas, gaivotas, andorinhas, sabiás, morros, favelas e aviões. Uma, duas, três, quatro... Um, dois, três, quatro... Uma, duas, três, quatro...
***
Uma mocinha loura se aproximou e me convidou para jogar frescobol. Ela era magrinha, lourinha e estava muito bonita de biquíni branco.
***
Jogamos frescobol. Tomamos uma coca-cola. Voltamos a jogar frescobol. Fomos jogar capoeira. Jogamos frescobol de novo. Fomos nadar juntos até o fundo do mar. Fomos até um barquinho branco, que balançava lá longe. Subimos nele, descansamos nele, mergulhamos dele. E nadamos de volta.

de cima do arpoador a turma tirava a maior onda
de cima do arpoador a turma tirava a maior onda

***
Saímos da água. Deitei na areia quase morto: eu não nadava nada. Ela brilhava translúcida na luz da tarde – me sorrindo, me olhando. Ela realmente era muito bonitinha, uma coisa mais linda de cabelos dourados, pele branquinha, olhos verdes, uma sereiazinha flutuando na brisa da tarde de Ipanema.
***
Corremos até o Leblon. Tomamos uma coca-cola. Corremos de volta até Ipanema. Quase morri. Tomamos outra coca-cola.
***
Aí, ela falou que ia embora porque era tarde e tinha muita coisa para fazer em casa. Falei que ia ficar ali. Pretendia continuar ali contando as ondas. Pedi para ela voltar. Ela prometeu que voltaria com um farolete para alumiar. Prometeu me ajudar na contagem – tinha muita onda no mar, sozinho eu não daria conta de coisa nenhuma, não daria conta de nada mesmo.
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Calculei mais um desengano. Calculei mais um desencontro. Calculei uma desilusão.

***
Mas ela voltou. Voltou depois da novela da oito.
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Primeiro contamos ondas. Depois, deitados na areia, contamos estrelas.
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Ela me perguntou o que eu fazia. Eu disse que não fazia nada mas fazia nada muito bem, com muita dignidade, elegância, classe. Ela me disse que cantava mas não cantava nada muito bem. Eu disse que era do samba. Ela me pediu um samba. Assoviei eu e a brisa. Ela disse que samba-canção não valia. Pedi então para ela cantar algum samba de mais valia. Ela disse que só cantava no chuveiro. Encerramos o papo
***
e continuamos silenciosamente contando estrelas do mar noite adentro buscando um sonho em forma de desejo.

sábado, julho 08, 2006

a vedete pede licença (27)



na minha cabeça, uma voz me pede licença para entrar no meu coração calejado de tanto solavanco e subida

(ando muito sentimental!)

quarta-feira, julho 05, 2006

modinhas ensurdecedoras (26)

sambas, boleros, rocks, mambos, chá-chá-chás, canções, etc pipocam na minha cabeça ensurdecedores.

segunda-feira, julho 03, 2006

Batuque na cabeça sinhá num qué (25)

sonhei a noite inteira com a voz de Clementina ribombando no fundo da minha cabeça: taratatá, ô crioula, taratatá!

domingo, julho 02, 2006

Futebol na Gafieira (24)

Foguete pulou sobre a orquestra feito um foguete americano em decolagem no cabo Canaveral e mordeu a bunda de Francisco Bombardeio. Chicão me bombardeou quebrando seu bombardino de prata sobre minha cabeça. Foguete não se intimidou muito com a minha dor e cravou os dentes firmes na bunda de Pedrão Esquadrilha, que gemeu ui-ui, mas não titubeou em enfiar seu trombone de vara minha goela abaixo. Foguete então se lançou contra os bongós, tambores, atabaques, zabumbas e mordeu a bunda de Tonhão Britadeira. Tonhão me devolveu meia dúzia de safanões na orelha esquerda, mais meia dúzia de bofetões na orelha direita – os quais estão repercutindo até agora na minha cabeça. Chico Pedregulho não esperou o ataque de Foguete – deu-me com o violão na cabeça repetidas vezes e, enquanto eu estava caído, aproveitou para me alvejar com cuícas, castanholas, triângulos, reco-recos, maracás e instrumentos menores. Mas Foguete estava com a macaca no corpo e não se deu por vencido: feito uma rabo de foguete brasileiro disparou sobre as bundas de Hermetão e Maurão com os caninos sedentos por sangue em riste.

–– Nhac! Nhac!

Ato contínuo, Hermetão e Maurão me agarraram delicadamente e me arremessaram contra paredes, mesas, cadeiras, palcos, balcões, garrafas, copos, garçons, dançarinos, garçontes, cozinheiros, porteiros, copeiros, cantores, enfim sobre a audiência inteira, que me recebeu com piparotes, socos, cuspidas e pontapés.

Me chutaram de la pra cá, pelo salão inteiro... E alguma alma compadecida me chutou para fora do clube, para o passeio público.

–– Gol! –– finalizaram todos em uníssono.

Com corpo estendido na sarjeta, moído de dor, notei que sentadinho ao meu lado Foguete me acompanhava fielmente. Me olhou, piscou, balançou o rabo e feito um foguete russo em disparada pulou e me tacou uma mordida na bunda.

–– Ui! Ui!

Seu Alfredo da Rocha Viana Filho preferiu ficar Pintando o Sete enquanto a bola rolava.